Leucemia é um câncer que se inicia nas células-tronco da medula óssea. A medula óssea fica na cavidade dos ossos e é o local onde são produzidas as células sanguíneas. Nela são encontradas as células que dão origem aos glóbulos brancos (leucócitos), aos glóbulos vermelhos (hemácias ou eritrócitos) e às plaquetas.
Trata-se de uma doença que acomete os glóbulos brancos e que tem como principal característica o acúmulo de células doentes na medula óssea – elas substituem as células sanguíneas saudáveis, diminuindo seu número normal.
Na leucemia, uma célula sanguínea que ainda não está madura sofre uma mutação genética que a transforma em célula cancerosa. Anormal, essa célula se multiplica mais rápido e morre menos que as células saudáveis, e é desta forma que as células normais da medula óssea vão sendo substituídas pelas anormais cancerosas.
No Brasil, a leucemia é o nono tipo mais frequente de câncer entre os homens, e não figura entre os dez tipos da doença mais incidentes entre as mulheres. Para 2020, o INCA (Instituto Nacional de Câncer) estimou 10.810 novos casos de leucemia.
Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), foram 474.519 novos casos de leucemia no mundo em 2020, e a doença ocupa a 13ª posição entre os tipos de câncer mais frequentes entre os sexos feminino e masculino.
Entre os fatores que aumentam o risco de desenvolvimento de leucemia estão o tabagismo, a exposição ao benzeno (substância encontrada na gasolina e largamente usada na indústria química), à radiação ionizante (raios X e gama) proveniente de procedimentos médicos (radioterapia), a alguns medicamentos de quimioterapia, ao formaldeído e a agrotóxicos. Ser portador de síndrome de Down, síndrome mielodisplásica e outras desordens sanguíneas também eleva o risco de surgimento da doença.
Tipos de leucemia
A leucemia é classificada de acordo com dois critérios. Um deles é a velocidade de sua progressão, podendo ser aguda (progride rapidamente e produz células que não estão maduras e não conseguem executar suas funções) ou crônica (progride lentamente e mantém um número maior de células maduras que conseguem realizar algumas das funções normais). O outro é o tipo de célula do sangue/glóbulo branco que está doente: mieloide ou linfoide.
Existem subtipos definidos por análises biológicas e genéticas. Combinando os critérios de classificação, são quatro os tipos mais comuns:
- Leucemia linfoide crônica (LLC): afeta células linfoides e se desenvolve de forma lenta. A maioria das pessoas com LLC tem mais de 55 anos, e ela raramente afeta crianças. É uma doença adquirida, e não hereditária;
- Leucemia mieloide crônica (LMC): afeta células mieloides e se desenvolve vagarosamente, a princípio. Acomete principalmente adultos. Pode causar anemia, fadiga, infecções, sangramentos e outros problemas colaterais, mas alguns pacientes são totalmente assintomáticos;
- Leucemia linfoide aguda (LLA): afeta células linfoides e agrava-se de maneira rápida. É o tipo mais comum em crianças pequenas, mas também ocorre em adultos;
- Leucemia mieloide aguda (LMA): afeta células mieloides e avança rapidamente. Ocorre tanto em adultos quanto em crianças, mas a incidência aumenta à medida que a pessoa envelhece.
Sintomas de leucemia
Os principais sintomas de leucemia são consequência do acúmulo de células defeituosas na medula óssea que prejudica ou impede a produção de células sanguíneas normais.
A diminuição de glóbulos vermelhos causa anemia, cujos sinais são:
- Fadiga;
- Falta de ar;
- Palpitação;
- Dor de cabeça
A redução de glóbulos brancos, por sua vez, provoca uma baixa da imunidade, o que deixa o organismo mais suscetível a infecções recorrentes e que podem ser graves.
Já a diminuição das plaquetas ocasiona:
- Sangramentos – sendo os mais comuns das gengivas e pelo nariz;
- Manchas roxas na pele – chamadas de equimoses; e
- Pontos roxos na pele – conhecidos como petéquias
Em geral, o paciente também pode apresentar como sintomas gerais de leucemia:
- Gânglios linfáticos inchados, mas sem dor (principalmente na região do pescoço e das axilas);
- Febre ou suores noturnos;
- Perda de peso sem motivo aparente;
- Desconforto abdominal (causado pelo inchaço do baço ou do fígado); e
- Dores nos ossos e articulações
Caso a leucemia chegue ao sistema nervoso central, podem surgir dores de cabeça, náuseas, vômitos, visão dupla e desorientação.
Diagnóstico de leucemia
Diante de sintomas e da suspeita de leucemia, devem ser realizados exames de sangue para avaliação médica específica. O principal desses exames é o hemograma completo, que, em caso positivo, apresentará alterações nos leucócitos – com um aumento em seu número na maioria das vezes, e muito raramente uma diminuição – associadas ou não à diminuição das hemácias e das plaquetas.
Outras análises laboratoriais a serem realizadas são:
- Estudo da coagulação (TAP, PTT, fibrinogênio);
- Análises bioquímicas (função renal, hepática, eletrólitos);
- Culturas de sangue (na presença de febre);
- Cultura de urina ou outros líquidos biológicos (na suspeita de infecções associadas);
- Exames de imagem de tórax e abdômen (diante de sintomas respiratórios e gastrointestinais).
A confirmação do diagnóstico é feita com o mielograma, que é o exame da medula óssea. Uma pequena quantidade de sangue é retirada do material esponjoso de dentro do osso para análise citológica (avaliação da forma das células), citogenética (avaliação dos cromossomos), molecular (avaliação de mutações genéticas) e imunofenotípica (avaliação do fenótipo das células).
Além dele, são exames utilizados para o diagnóstico de certeza:
- Hematoscopia – confirma a presença de blastos circulantes no sangue periférico;
- Imunofenotipagem do sangue periférico – confirma o percentual e o fenótipo de blastos, o que permite caracterizar o subtipo de leucemia;
- FISH (fluorescence in situ hybridization) para determinadas alterações citogenéticas – permite pesquisar alterações específicas que determinam a escolha da terapia inicial; e
- PCR (polimerase chain reaction) para alterações genéticas recorrentes – essencial para a classificação de acordo com a OMS e para a orientação do prognóstico e a escolha do tratamento.
Em alguns casos, pode ser necessária a realização da biópsia da medula óssea, feita com a análise de um pequeno pedaço do osso da bacia por um médico patologista.
Tratamento
O tratamento de leucemia tem o objetivo de destruir as células doentes, para que a medula óssea volte a produzir células normais.
Em casos de leucemias agudas, o tratamento envolve quimioterapia, controle das complicações infecciosas e hemorrágicas e prevenção ou combate da doença no sistema nervoso central (cérebro e medula espinhal). Em alguns casos, é indicado o transplante de medula óssea.
A primeira etapa tem a finalidade de chegar à remissão completa, ou seja, voltar a um estado de aparente normalidade após a quimioterapia com a combinação de medicamentos. Esse resultado pode ser alcançado em torno de um mês após o início do tratamento (fase de indução de remissão), quando os exames de sangue e da medula óssea não mais evidenciam células anormais.
Porém, como pesquisas mostram que restam no organismo muitas células leucêmicas – a doença residual –, se faz necessário continuar o tratamento para não haver recaída. Nas etapas seguintes, o tratamento varia de acordo com o tipo de célula afetada pela leucemia. Nas linfoides, isso pode durar mais de dois anos, e nas mieloides, menos de um ano (exceto nos casos de leucemia promielocítica aguda, que também dura mais de 2 anos).
Na leucemia linfoide aguda (LLA), o tratamento tem três fases: indução de remissão, consolidação (tratamento intensivo com quimioterápicos não empregados anteriormente) e manutenção (o tratamento é mais suave e contínuo por vários meses). Durante todo o processo, pode ser necessária a internação por infecção decorrente da queda dos glóbulos brancos normais e por outras complicações do próprio tratamento.
Na leucemia mieloide aguda (LMA), a etapa de manutenção só é necessária para os casos de leucemia promielocítica aguda (um subtipo especial de LMA relacionado a hemorragias graves no diagnóstico). Nesses casos, existe uma mutação genética específica que pode ser detectada nos exames da medula óssea, e o tratamento com uma combinação de quimioterapia e comprimido oral (tretinoina) possibilita taxas de cura bastante elevadas.
O tratamento da leucemia mieloide crônica (LMC) é alvo específico (inibe a multiplicação das células cancerosas sem afetar as células saudáveis). Essa leucemia decorre do surgimento de um gene específico (gene BCR-ABL), capaz de aumentar a multiplicação celular por meio da proteína chamada tirosina quinase. Utiliza-se um medicamento oral da classe dos inibidores da proteína. Caso haja resistência da doença depois dessa etapa, parte-se para a quimioterapia ou para o transplante da medula óssea.
Na leucemia linfoide crônica (LLC), o tratamento pode contar com agentes quimioterápicos, imunológicos (anticorpos monoclonais) e orais. A escolha dependerá de aspectos clínicos do paciente, como idade, presença de outras doenças, capacidade de tolerar quimioterapia e das características da doença em si.
Prevenção
A maior parte dos casos de leucemia não apresenta fatores de risco que possam ser modificados, ou seja, são casos de leucemia que não podem ser prevenidos.
Evitar a exposição a substâncias como o benzeno, ao formaldeído e a agrotóxicos, porém, é uma forma de diminuir o risco de desenvolvimento da leucemia. O mesmo vale para o tabagismo, fator de risco para a leucemia mieloide aguda: parar de fumar é sempre uma boa ideia e pode, como bônus, evitar outros tipos de câncer (especialmente de pulmão, boca e bexiga), além de doenças como enfisema, infarto do miocárdio e acidente vascular cerebral.